Troca de pele

Serpentina, novo álbum de Banks, mostra a cantora em uma fase ainda mais entediante

brille
3 min readApr 11, 2022

Eu me lembro perfeitamente do meu primeiro contato com a cantora Banks. Não foi uma recomendação algorítmica, mas uma indicação humana de uma amiga que me conhecia melhor do que qualquer plataforma digital. As músicas com letras raivosas e um tanto quanto vingativas, quase sempre combinadas com batidas dançantes e sensuais, eram tudo o que eu queria ouvir naquele momento. E não bastava apenas ouvir passivamente: era preciso voltar toda minha atenção à Banks para entender o que ela tinha a dizer.

Goddess e The Altar, os dois primeiros álbuns de Banks, retratam o desespero mental da cantora após ser constantemente desmoralizada por narcisistas patológicos. Mas, ao invés de sucumbir à depressão, Banks reavalia a situação criticamente e dá a volta por cima. Ela chega ao auge do empoderamento feminino com a faixa Goddess, na qual se autodenomina como uma deusa e, com muita classe, roga pragas àqueles que não se deram conta de seu valor.

No entanto, Banks parece estar confortável demais para continuar entregando trabalhos como os anteriores. III, seu terceiro álbum lançado em 2019, já carecia da potência sentimental que ela havia apresentado ao grande público, mas ainda tinha seu mérito enquanto trilha sonora de provador da C&A. A grande decepção veio com Serpentina, lançado na semana passada.

Como sou a única usuária do Deezer no Brasil, optei por incluir o link para o Spotify.

Banks divulgou Serpentina como um álbum em que teve maior liberdade criativa, já que agora faz parte da AWAL, gravadora filiada à Sony cuja proposta é oferecer independência aos artistas. Ela também revelou ter alcançado proficiência no software de produção musical Ableton, podendo assim se aventurar em novas experimentações. O problema é que nada disso se reflete em Serpentina.

Banks caracterizada como a criatura folclórica Chupa Cu de Goianinha em imagem de divulgação de Serpentina.

Misunderstood abre o álbum dando a impressão de que vem coisa boa por aí, mas acaba de maneira quase abrupta com menos de um minuto e meio de duração. O que se segue são faixas que, embora não sejam ruins, também não têm muita expressão. As exceções que podem vir a viralizar no TikTok são Holding Back, desabafo de um amor co-dependente em que Banks brinca com distorções vocais, e a também desesperadamente apaixonada Anything 4 U, na qual Banks anuncia a um ritmo dançante que seu amado não deve fazer nada que ela não faria, mas que ela faria qualquer coisa por ele.

Banks e o novo namorado a quem ela dedica suas canções em Matinhos, no litoral paranaense.

Ironicamente, o título Serpentina faz referência à troca de pele das serpentes. Mas o resultado é mais do mesmo em qualidade inferior: apesar da intensidade e sensualidade características da cantora estarem presentes em alguma medida, o álbum gera preguiça. O exercício de apreciar cada uma das faixas atentamente, que Goddess e The Altar nos convidavam a fazer, é impraticável em Serpentina. Algumas faixas precisam ser puladas, enquanto outras entram por um ouvido e saem pelo outro instantaneamente.

Esperamos que a próxima troca de pele de Banks cative mais do que Serpentina.

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